Hoje
iremos compartilhar com vocês uma entrevista realizada com um profissional
Caminhoneiro. Tal atividade foi proposta para a matéria de Psicologia
Organizacional e do Trabalho, visando agregar de forma significativa um olhar
mais abrangente acerca desta prática profissional.
Referente
ao seu perfil, cabe destacar que M, sexo masculino, tem 44 anos, é divorciado e
possui segundo grau incompleto. É autônomo, seu tipo de caminhão é carreta
(veículo articulado – container) e percorre a rota Inter Estadual. Possui como
dependente um filho de 12 anos de idade.
Em
relação ao tipo de carga, afirma que devido a trabalhar no segmento de
container (unidade de transporte) ao qual é acoplado no reboque da carreta, é
possível a transportar diversos tipos de cargas, desde frigorífica para
transporte de alimentos perecíveis à cargas secas como carros. O entrevistado
enfatizou que também já transportou mercadorias como carvão mineral, pois
segundo o mesmo tudo pode ser carregado em container e posteriormente ser transportado
por navio.
No
que tange as perguntas realizadas a M., o mesmo foi acessível e buscou
esclarecer todas as questões realizadas. Vamos apresenta-las seguindo a ordem
da entrevista e posteriormente nossa análise sobre elas.
1) Em média, qual é o
tempo de duração das rotas, ou seja, média horas/dias viajando?
Segundo
o entrevistado o tempo é muito relativo dependendo do destino(distância),
estrada(topografia) o agravante maior sempre é o trânsito, segundo (M) o mesmo
realiza uma média de 10 horas de viagem para São Paulo onde percorre uma
distância de 600km se não houver problemas de acidentes ou obras.
2) Na maioria das
vezes, como você consegue o frete?
Segundo
M o mesmo consegue frete na maioria das vezes através de transportadoras.
3) Como a sua família
se posiciona em relação a sua profissão?
Segundo
entrevistado de modo geral sua família deseja que o mesmo mude de profissão.
4) Costuma passar
quantos dias (média) em casa entre as viagens?
M
nos declarou que quando a carga está boa, o mesmo chega de manhã e já sai no
período da tarde, passando a noite nas estradas, nos postos e hotéis. A cada 15
dias passa o final de semana com o filho.
5) Como ocorreu a
escolha por essa profissão, o (s) motivo(s) para permanecer na profissão?
Segundo
M a escolha ocorreu por vontade própria, por admirar muitos familiares que
seguem a mesma profissão e a permanência se dá devido a renda, o entrevistado
considera que com pouco estudo em outra profissão não teria ganhos
relativamente grandes.
6) Como avalia as
condições (riscos) dessa profissão?
M
considera as condições perigosas pois trafega com um veículo com mais de 40
toneladas na maioria das vezes, e isso em rodovias obsoletas mal projetadas e
mal conservadas. As pedagiadas e principalmente as que estão sobre a tutela do
governo estão neste estado, outro fator é a violência, o entrevistado nos
relatou: “Somos assaltados a mão armada em pátio de posto, sinal de trânsito
para roubar o veículo e a carga ou quando somos apedrejados no para-brisa de noite
em viadutos e passarelas para provocar acidentes e saquear a carga e roubar os
pertences do motorista”.
7) Qual é a sua opinião
sobre a nova lei do descanso (Lei nº 12.619/12)
Relato de M em relação ao questionamento
da nova lei do descanso:
“Criar
a lei e assinar uma folha de papel é muito fácil, só que os políticos esquecem
que precisa de uma estrutura para que ela seja cumprida, não temos em nenhuma
base do pedágio um estacionamento para descanso de caminhões, ai perguntam e os
postos de combustíveis? aonde tem muito trafego os postos às 18 horas começam a
isolar o pátio com fitas zebradas e só da pernoite para o cliente que abastece,
pois não são instituição de caridade, e deve ter distinção entre autônomo e
empregado mediante horas de descanso”.
8) Teve alguma doença
em decorrência desse trabalho?
O
entrevistado relatou ter problemas na coluna e no nervo ciático. Devido ao
exercício da profissão de motorista de caminhão.
SUGESTÕES DO
ENTREVISTADO
v Relatos
de M:
“Por incrível que
pareça o que mais nos atrapalhou foi o chamado pró caminhoneiro, que si tire
este nome pois eu não conheço nem um autônomo que adquiriu um caminhão por este
financiamento. Transportadoras que não tinha capacidade de comprar um caminhão hoje
tem dois, cinco até mais e pior não houve renovação de frota e sim acumulo, os
caminhões velhos negociados por empresas grandes não poderiam ser colocados de
novo nas estradas (estes caminhões são os que sobram para os autônomos adquirir
com juros absurdo de bancos) ai temos uma frota sucateada”.
“DIESEL
e o refugo do refino do petróleo, e um combustível barato mais temos nos teles
jornais a explicação para ele estar tão caro mediante os políticos e
empreiteiros imundos e corruptos, a população só penca em gasolina mais óleo
DIESEL incide sobre o valor de tudo pois tudo e transportado e muitos
equipamentos são movidos por ele não só caminhão como tratores, ônibus, trens,
barcos de pesca, grupo geradores, termoelétricas e etc”.
“Deveria
ter tabela de frete com valor mínimo fixado por km rodado, pois taxi e ônibus
tem e não é inconstitucional, sem isto o transporte continua “terra de ninguém”
aonde quem pode mais chora menos. O perdão pelo desabafo...”
Em relação a nossa análise diante dos dados coletados, é possível
destacar que que Segundo Masson (2010) no artigo Estilo de vida, aspectos de
saúde e trabalho de motoristas de
caminhão, em muitos outros estudos o perfil do motorista de caminhão é semelhante,
sendo a categoria profissional constituída basicamente pelo gênero masculino,
homens que têm uma família constituída e, em geral, sustentam a família. Essa
profissão, que garante as condições de sustento do lar, tem características
próprias, que fazem com que o motorista conviva pouco tempo com a família,
viajando durante longo tempo sozinho, longe de momentos e datas familiares
importantes, o que o torna, muitas vezes, um profissional isolado. Nesse
sentido, observa-se que para se estabelecer um padrão de qualidade de vida, é
essencial o equilíbrio entre o trabalho e o lazer.
Na profissão de motorista não existe rotina diária de trabalho, não há
horário previsto para refeição e descanso, ou datas previstas para estar com a
família.
Apesar de todas as dificuldades que o motorista enfrenta no trabalho, é
possível observar que muitos ainda encontram satisfação e se orgulham da
profissão como foi o caso do nosso entrevistado que relatou gostar do que faz e
o fazer além de por motivos financeiros por influência de familiares que também
exercem a mesma profissão.
Masson (2010), fez uma pesquisa com 105 caminhoneiros e o grau de
escolaridade da maioria dos entrevistados foi inferior a oito anos de estudo
para 64,8% da amostra. Esse resultado,
vai ao encontro a um dos relatos do entrevistado relacionado a sua escolha pela
profissão.
A trajetória profissional do motorista de caminhão interfere em sua
saúde, pois o torna vulnerável ao uso de drogas psicoativas, a problemas
posturais – caso de nosso entrevistado - e às práticas sexuais eventuais.
Segundo Botelho (2011) estes profissionais, com o ritmo intenso de
trabalho a que são submetidos, devido às longas distâncias a serem percorridas,
as responsabilidades de entrega e seguridade tanto da carga quanto do veículo,
diante destes fatores, os caminhoneiros necessitam dormir na boléia, com
alimentação conforto e segurança precária e acabam por desenvolver desgaste
físico-mental, bem como, emocional-afetivo interferindo na qualidade de vida do
indivíduo. Penteado (2008) reitera a existência de comprometimentos na saúde em
decorrência do exercício da atividade profissional dos caminhoneiros.
Tal afirmativa, vai ao encontro da fala do entrevistado em que avalia
as condições de trabalho como perigosas, trafegando em rodovias mal projetadas
e mal conservadas, ressaltando ainda questão da violência. Segundo Martins e
Dell’Agli (2014) no que se refere à pessoa, os entrevistados demonstraram
admiração por pessoas generosas, justas e honestas; como motoristas, refletiram
admiração por honestidade e respeito.O que vai ao encontro do que coletamos com
o nosso entrevistado que relatou seguir a profissão por necessidade e admiração
pela conduta como motoristas de caminhão de alguns familiares seus.
Quanto à indignação, mencionada também por Martins e Dell’Agli
(2014) no que tange as condições de
trabalho os motoristas entrevistados demonstraram grande indignação e
insatisfação, o que coincide com o relato de M. que em diversos momentos mencionou
aspectos referentes as condições de trabalho bem como a Lei do Descanso que lhe
geram indignação.
Outro fator que é possível relacionar são os problemas na coluna e no
nervo ciático devido a profissão, durante viagens que podem durar até 10 horas
ficando nítido a diminuição da qualidade de vida em função do trabalho, fato
este confirmado por diversas pesquisas que vêm descrevendo os
impactos negativos sobre a saúde geral destes profissionais, destacando
ainda a necessidade de desenvolvimento de ações educativas de promoção a saúde
em uma perspectiva mais ampla e abrangente, envolvendo profissionais e empresas
contratantes, bem como lhes proporcionar uma melhor qualidade de vida no
próprio trabalho, com melhores condições de segurança e rodovias acessíveis
para o uso dos mesmos.
Em relação a afirmativa do entrevistado no que refere-se a nova lei,
Waltrich (2014) aponta que a inexistência de políticas públicas que garantam
eficiência traduz o descompasso dos poderes legislativo e executivo em nosso
país.
Dessa forma, torna-se necessária a conscientização da sociedade e do
poder público, para que sua atuação ocorra de maneira eficaz, de forma que
sejam efetivadas as políticas públicas tributárias necessárias à implementação
dos institutos facilitadores, para que mais uma vez não sejam esquecidos, sem
que ninguém seja punido, nem o motorista pelo descumprimento justificado, nem o
Estado, por ser negligente em sua tarefa de manter condições suficientes e
eficazes para estes profissionais. (Waltrich, 2014)
E aí, vocês gostaram? Porque nós ADORAMOS essa experiência, que nos
possibilitou compreender um pouco sobre uma profissão tão necessária para o dia
a dia de todos! Agradecemos ao nosso entrevistado pela disposição e por
compartilhar sua prática profissional!
REFERÊNCIAS
v BOTELHO,
Lúcio José; DIESEL, Lilian Elizabeth; FREIXIELA,Adamczyk, JAIRA; Maria.
Profissão motorista de caminhão: uma visão (im)parcial. Saúde &
Transformação Social / Health & Social Change, vol. 2, núm. 1, 2011,
pp. 108-113.
v MARTINS,
Luzia Teixeira; DELL’AGLI, Betânia Alves Veiga. Valores de Motoristas de
Caminhão: o que lhes causa Admiração Indignação? In. Psicologia,
Ciência E Profissão, 34(4), 894-915,2014.
v MASSON;
Monteiro. Estilo de vida, aspectos de saúde e trabalho de motoristas de
caminhão. Campinas: Universidade Estadual de Campinas.SP, 2010
v PENTEADO,
Regina Zanella et al. Trabalho e saúde em motoristas de caminhão no interior de
São Paulo . Saúde e Sociedade, [S.l.], v. 17, n. 4, p. 35-45 , dez. 2008.
v WALTRICH,
Dhieimy Quelem. A necessidade de implementação de políticas públicas
tributárias que garantam efetividade a Lei n. 12.619, de 30 de abril de 2012,
que regulamenta a profissão do motorista. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE
DEMANDAS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA, 11; MOSTRA DE
TRABALHOS JURÍDICOS CIENTÍFICOS, 7. 2014, Santa Cruz do Sul - RS. Santa Cruz do
Sul: UNISC, 2014. P. 1-15.